CAPÍTULO 1
1864
aria Luísa Natalie Callaghan Queirós de Castilho já havia terminado o curso de enfermagem na Corte, apesar de seus pais terem sido contra desde o início, e mesmo assim conseguiu convencê-los de que era seu sonho cuidar de pessoas enfermas nos hospitais. Entretanto, no início do ano de 1865 estava estabelecida uma crise diplomática entre o Brasil e a Inglaterra no Império de Dom Pedro II. Tudo começou por causa de uma discussão três anos antes envolvendo três oficiais da Marinha inglesa e uma sentinela de um posto de polícia. Os dois foram presos por terem ofendido a sentinela totalmente à paisana e embriagados. O embaixador inglês William Christie exigiu desculpas oficiais e o pagamento da carga a D. Pedro II. No final do ano anterior, o Paraguai aprisionou um navio brasileiro e logo depois invadiu o Estado do Mato Grosso, com o intuito de reivindicar os mesmos direitos que os países vizinhos tinham quanto à navegação e ao comércio no rio da Prata – ponto estratégico disputado pelo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai relativo à economia em torno da navegação nessa área.
A guerra já foi declarada pelos paraguaios, mas o Império brasileiro ainda não havia se manifestado a respeito, o que poderia acontecer a qualquer momento. Maria Luísa, assim como todos esperava ansiosa pelo desenrolar dos acontecimentos, e por isso foi procurar pelo major Martim Afonso Almeida no quartel do Comando Militar. Há um ano e meio eles dois estavam juntos, e sempre ambos se encontram às escondidas por causa dos pais dela.
Ao chegar, um dos soldados permitiu que ela entrasse em seu gabinete, com a desculpa de que precisava informá-lo sobre o estado de saúde de dois soldados feridos que estava cuidando na Santa Casa. O Marquês de Resende era um dos provedores do hospital, que há muitos anos contribuía de forma atuante para a melhoria nas instalações. Quando o Major Almeida a viu, levantou-se rapidamente e correu para abraçá-la contente em voltar a vê-la.
─ Porque você se arriscou vindo aqui me ver, Maria Luísa? – ele indagou aturdido.
─ Eu estava com saudades de você. Não gostou da surpresa? – ela disse sorrindo com as mãos apoiadas no ombro do amado.
─ Essa surpresa foi maravilhosa, meu amor. Mas você se expôs demais ao vir aqui. – ele declarou cauteloso.
─ Eu sei que ninguém pode desconfiar de que nós dois estamos juntos, mas estou com um pressentimento muito ruim Martim. O Paraguai já declarou guerra ao país e eu sei que o Imperador vai aceitar o confronto, mas não quero vê-lo envolvido nisso. – ela disse apreensiva.
Ele se afastou dela e voltou para a mesa onde reuniu alguns papéis sem conseguir encará-la, o que a fez estremecer de medo ao constatar que Martim está pensando em participar da guerra.
─ Então você está mesmo pensando em se envolver nesse confronto, estou certa? – ela perguntou hesitante.
─ Não conseguiria mentir para você Maria Luísa. A situação entre os dois países está crítica, e o Império não vai ficar de braços cruzados enquanto os paraguaios invadem a província de Mato Grosso e do Rio Grande do Sul. As tropas já estão sendo mandadas para as áreas de conflito. Bem... Eu provavelmente também serei escalado para fazer parte da tropa que partirá para o Sul do país no final do mês. – ele disse sincero, e esperou pela reação dela com a revelação.
Ela se aproximou dele com os olhos marejados e o fitou intensamente desejando que aquilo não passasse de um pesadelo.
─ Por quanto tempo acha que vamos ficar longe um do outro? – ela indagou triste.
─ Não faço idéia de quando isso irá acabar, mas prometo que irei voltar pra você e assim ficaremos juntos para sempre. – ele disse com esperanças enquanto a abraçava forte.
─ Eu vou esperar por você aconteça o que acontecer. Talvez eu tenha que voltar para a fazenda, mas sempre vou procurar obter notícias suas. Enquanto isso, eu irei conversar com os meus pais sobre o nosso relacionamento. Espero que eles aprovem a nossa união para que nós possamos nos casar assim que você volte da guerra Martim. – ela disse convicta pretendendo cumprir a sua promessa.
Ele ficou tão emocionado com as palavras dela que a beijou com ardor, pretendendo arrancar-lhe todos os receios que nutria em seu peito. Maria Luisa ainda não conseguia tirar aquele pressentimento ruim da sua cabeça, e foi com o coração apertado que se despediu do seu amado saindo do gabinete logo em seguida.
Maria Luísa receberia a visita dos seus pais naquele final de semana em sua imponente casa na Corte. O Marquês de Resende só deixava a sua fazenda quando tinha que tratar de assuntos urgentes no Ministério, e ele marcara uma reunião para o início da semana seguinte com o Imperador para oferecer seus préstimos que subsidiassem a batalha contra Solano Lopez, o ditador paraguaio. Outros fazendeiros importantes do Vale do Paraíba também pretendiam colaborar financeiramente com o governo Imperial, que tanto beneficiou a oligarquia cafeeira apesar da recente proibição ao tráfico de escravos na província.
Quando finalmente o dia da reunião havia chegado, Maria Luisa e sua mãe Lady Christine estavam na sala de estar esperando pelo Marquês, que voltou minutos depois do Palácio Imperial com o semblante preocupado.
─ Então, acredito que não trouxe boas notícias, não foi? – Lady Christine indagou vacilante.
Ele colocou seu bastão de marfim e osso no local de sempre e se dirigiu a sua poltrona predileta, que fora produzida por um artesão português muito requisitado pelos nobres da época, e então, fitou as duas pessoas mais importantes da sua vida com certo pesar no olhar.
─ A situação é crítica, pois os paraguaios estão abrindo várias frentes de guerra do Mato Grosso ao Rio Grande do Sul, mas até o momento a Argentina se mantém neutra perante o assunto, embora eu acredite que os paraguaios pretendem se aproveitar desta situação. Parece que as tropas daqui seguirão até as áreas de conflito, e esperamos que a situação se reverta a nosso favor. – explicou seriamente para as duas que o escutavam atentamente.
─ Meu pai, o senhor já sabe quem serão os oficiais que farão parte da frente de batalha? – Maria Luisa perguntou sem conseguir esconder sua curiosidade.
─ A primeira esquadra será comandada por Barroso, mas haverá também outros oficiais importantes como o Almirante Tamandaré e o Major Almeida.
─ É sobre o Major Almeida que eu quero conversar com os senhores hoje. Ele vai me pedir em casamento assim que retornar da guerra, meu pai. – Ela declarou com a postura altiva.
Ela não tinha conseguido esperar mais para fazer aquela revelação, e desejava do fundo do seu coração que ambos aceitassem a união para o próprio bem dela.
─ Você não deve estar falando sério num momento como este Maria Luisa. Que história é essa de querer se casar com o major Almeida eu posso saber?
─ Sim, eu estou falando sério papai. Eu desejo muito que os senhores aceitem a nossa união...
─ Então, quer dizer que esse mancebo já estava cortejando você aqui na Corte sem o nosso consentimento Maria Luisa? – ele interpelou a interrompendo com bastante irritação.
─ De certo modo é a verdade, meu pai. Mas procure entender que nós nos amamos e pretendemos nos casar assim que essa guerra acabe...
─ Desista dessa idéia descabida Maria Luisa Natalie Callaghan Queiroz de Castilho. Enquanto eu viver, você só se casará com quem eu e sua mãe desejarmos. Nunca permitirei que minha única filha se junte a um militar abolicionista que ainda por cima não pertence a nossa classe social.
Lady Christine se aproximou da filha, e em seguida pôs suas mãos nos ombros dela tentando confortá-la, apesar de fitá-la nos olhos sem deixar transparecer nenhuma emoção.
─ Entenda querida, eu e o seu pai estamos pensando no seu próprio bem, e, além disso, você já imaginou que ter um homem desses como seu esposo só faria o seu sofrimento aumentar a cada dia em que o espera retornar a sua casa vivo ou morto? – Lady Christine declarou sensatamente.
Maria Luisa respirou profundamente e pediu licença querendo se retirar para o seu quarto, pois queria ficar sozinha entregue aos seus pensamentos. Ela estivera chorando muito por alguns minutos, mas uma idéia começava a povoar sua mente de forma persistente. Aquilo seria uma loucura realmente, mas ela não queria voltar para a fazenda e ficar longe das notícias sobre a guerra. Precisava ficar perto do Major, e sabia que o seu destino não seria igual ao da maioria das mulheres do seu tempo. Maria Luisa queria contribuir para a sociedade naquilo que sabia fazer de melhor: Cuidaria dos enfermos nas áreas de conflito junto aos demais médicos e enfermeiras da Santa Casa, que sairia da Corte rumo ao Rio Grande do Sul.
Seus pensamentos foram interrompidos por um barulho na porta de carvalho. Era a sua mãe que pedia sua permissão para entrar no quarto. Maria Luisa se levantou da cama hesitante para destrancar a porta e deixá-la entrar. Ela em seguida, se afastou da porta e se dirigiu com o semblante rígido até a janela sem dizer uma palavra. Lady Christine já conhecia aquele olhar, e se perguntava qual seria a nova idéia descabida que passava pela cabeça da sua filha daquela vez.
─ Natalie, vim aqui para avisar-lhe que amanhã bem cedo voltaremos para a fazenda. Queremos que você também volte conosco querida. – ela avisou hesitante.
─ Os senhores irão sozinhos dessa vez. Eu pretendo ficar aqui na Corte e como haverá uma guerra, eu seguirei com alguns colegas da Santa Casa para algum hospital de sangue no Rio Grande do Sul. – ela respondeu altiva e decidida a seguir o seu destino.
Lady Christine ficara tão horrorizada com aquela revelação, que precisou se sentar numa cadeira próxima, temendo desmaiar sem forças com o que acabou de ouvir.
─ Em que século você acha que vive eu posso saber? Este tipo de atitude é inconcebível na nossa sociedade e, além disso, o seu pai e eu jamais aprovaremos essa loucura, trate de esquecer isso, está me ouvindo?
─ Os senhores não entendem que eu estou bem à frente do meu tempo, minha mãe. Eu te suplico que me ajude a seguir o meu destino e não conte ao Marquês os meus planos, por favor. Eu posso contar com a sua ajuda? – ela pediu fitando a mãe profundamente com seus olhos azuis escuros.
Lady Christine estava no auge da sua beleza, e ambas possuíam cabelos loiros bastante compridos, estatura alta que lhes garantia uma elegância incomum, mas com temperamentos bem diversos uma da outra. Maria Luisa era teimosa e impulsiva como o Marquês, enquanto que Lady Christine tinha o costume inglês de jamais exasperar-se sempre adotando uma postura indiferente e fria diante das circunstâncias, exatamente como fizera ainda há pouco.
Lady Christine sorriu mostrando que aceitaria ajudá-la, e se dirigiu até a janela para abraçar sua única e adorada filha. Mesmo discordando das suas atitudes, Lady Christine nunca tivera coragem de contrariá-la em suas decisões. O Marquês de Resende, ao contrário, possuía um temperamento forte, e como descente de Portugueses defendia as tradições com unhas e dentes. Para ele, as ordens do chefe de família deveriam ser seguidas e respeitadas, mas sua única filha sempre fora voluntariosa demais para obedecê-lo. Acabava por fim cedendo muitas vezes aos caprichos dela mais por intermédio de Lady Christine, que sabia persuadi-lo como ninguém.
Minutos mais tarde, Maria Luisa estava novamente sozinha no quarto, e esperava que sua mãe conseguisse esconder do seu pai a sua participação no que seria o maior conflito da história do país.
Ótima ideia colocar seu livro aqui no blog! De capítulo em capítulo acho muito mais fácil acompanhar uma leitura! Pude perceber que se trata de uma história que retrata o passado de nosso país! É muito original para os dias de hoje e criativa! faço vbotos de que seja publicada, Mariana!
ResponderExcluirAcompanho esse livro pelo Bookess e torço para que um dia ele seja publicado. Continue escrevendo... XD
ResponderExcluirAdoreiii o primeiro capítulo *---*
ResponderExcluirMal vejo a hora de ler! Estou super ansiosa para o lançamento :)
Parabéns pelo ótimo trabalho ^^
Eu realmente quero ler este livro!!!
ResponderExcluiramei o primeiro cap!! espero o lançamento... pq qro mtp a continuaçao *0*
ResponderExcluirAdorei o primeiro capítulo do livro e a capa é incrivel!!!
ResponderExcluirParabéns!